28 de março de 2012

cresço

a criança descobre a palavra onde cabe o mundo onde cabem palavras. quando cresce, as palavras são poucas para tanto mundo que se tem por dentro que se tem por fora. o mundo é sempre muito. numa língua desconhecida é preciso calma para que cada palavra carregue em si o universo e não se rompa por excesso. a lua, que não cabe na sacola, pode caber na retina.

26 de março de 2012

os aviões deixam um risco branco no céu azul desta cidade. sei disso quando não estou dentro deles. antes, uma pátria me pertencia e eu pertencia a um país. hoje, quem pertence a quem? se as fronteiras são traços de caneta em mapas de argila. e há água a se depositar camadas calcáreas na pele do planeta que habito e não pertenço. um eu, essa minúscula bactéria sobre a face da terra, insiste em se saber hemoglobina.

15 de março de 2012

na floresta de palavras

entro no quarto escuro, desconhecido. tateio. tateia-me a forma, objetos a delinear na ponta dos dedos meus e dos dedos objetos que tateio. um quase saber-se nesse já como se é. quase. pequena epifania que falta. luz. entro e saio do quarto escuro. procuro que meus olhos se adaptem os cheiros orientem a brisa de alguma janela. às vezes uma fresta por onde uma sombra então uma pedra e outra vez o escuro.
bem, bem depois, compreendo um pequeno poema. um verso dele sei. o poema que sei.

el temps no és res més que um gran bosc de paraules. (marti i pol)

12 de março de 2012

impressões de limpeza - 2

para uma boa faxina, são precisos método, organização, persistência, muita paciência.
e um rodo.

10 de março de 2012

primavera outra

andar a pé também é deixar que a poeira se deposite em silêncio pelos cantos, esperar que sobre o fogo a água ferva e fervendo cozinhe o ovo, que o homem no escuro em vez de flores estenda a mão a entrelaçar dedos, nossos.
de madrugada, como sabíamos desde os nossos oito anos, o sabiá que aqui gorjeia não há.

5 de março de 2012

impressões de limpeza

no supermercado, piazzola e uma prateleira de produtos de limpeza por decodificar. não existe rodo. a senhora ao meu lado queria o limpiacristales que usava desde sempre e não o encontra. lamenta-se e me pergunta se a posso ajudar. digo que não. ou digo que sim, que a posso ajudar na cumplicidade de um chão que sai sob os pés ou de um vento que revira. ela agradece. sorri. e diz que os novos escovões de limpar pisos são muito melhores que os rodos e panos de chão de antigamentes. mas não esqueça, ela acrescenta, leve também o balde.