31 de janeiro de 2014

na noite

alguma coisa me diz que há alguma coisa que não estou vendo. a cegueira é minha, estendida, espero que todos estejam de olhos cerrados, como os meus. a guerra também é minha. serei quem mata serei quem morre, no mesmo gesto, no incêndio, na bandeira branca, não importa. algo me diz: mantenha os pés no chão. e retroceda, quando for a hora. quando é a hora? os pés sabem. as mãos se perdem. não se perca. a guerra não é de ninguém. não há guerra. também as bandeiras brancas. existem? e o fogo e os olhos. e as coisas que vejo sem vê-las.

quem tem mãe não faz filosofia, diz o menor de todos, e este filosofar em si me surpreende. pergunto se conhece algum filósofo. diz um nome e acrescenta: aquele dos figos e a carta. o filósofo dos figos. o filósofo da carta. que por certo teve mãe, penso. como teve sua batalha pública tão particular, e perdeu os pés quando se soube menos cego e mais sozinho.

há alguma coisa que vejo quando o silêncio me toma. quando estendo as mãos no ar morno do escuro da noite imóvel. aquela mesma noite que me abria quase punhaladas na pele, e era alegria a minha, e eram punhaladas na pele da minha mãe que chorava - água gotejando entre as flores - o pai que já não estava. a alegria dela nenhuma. cada uma, pedras pontiagudas sob os pés. pisávamos, ambas, delicadamente, os cristais.

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