6 de dezembro de 2015

por que, mesmo, estamos aqui?

cento e onze homens mortos
no tempo de uma vida depois cento e onze tiros nos mesmos corpos
meninos
custo a descrer que, no fundo no fundo, sejamos todos lindos e iluminados
porque não, não somos
queremos o líquido dos bichos, esse mínimo
queremos o que querem os mais fortes sobre o minúsculo
o tempo cotidiano do senso prático a criar os filhos como se fossem só meus


na gaveta que todos sabíamos havia uma arma para o caso
atenção: todos têm na gaveta uma arma para o caso?
no dia que seria o caso ignorou mulheres e disse para o menor: pegue isto para protegê-las
de que nos protege a mão de uma criança?
o de viver como bichos?
o de amar sem amor?
corpos mortos empilhados uns sobre os outros todos buscando armas contrabandeadas do fundo dos seus olhos
custo a crer, no fundo no fundo, todos a temer o dia que não vem a noite que vem depois de cada abraço
veja o menino, cuja mão tremia no gatilho do que lhe era desconhecido, veja
deixar o dedo repousar

não tinham armas os meninos nem têm gavetas
cento e onze tiros meninos cinco mortos
nossos olhos abertos na escuridão estrelada da pele
os olhos bem abertos
no banco do motorista no banco do passageiro no carro branco branco sangra a visão
esses meninos
no fundo no fundo, custo, ou já nem custo tanto, a crer nos habitam monstros disfarçados de sensatez
uns poucos, dizem, não sentem dor e talvez, veja que digo talvez, nisto resida nosso grande segredo, nossa sobrevivência
não sentir dor

por ela uns buscam o calor da casa
por ela outros tantos só queremos a porta: a porta: e sair

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