26 de setembro de 2016

desertos

procuro desesperadamente uma palavra que perdi dentro de um poema. procuro o poema entre os livros da minha pequena biblioteca, entre a chuva do dia. sei que havia uma conexão com a palavra deserto e esta conexão me permitia compreender o mundo, compreender por que me volto ao ouvir uma voz no silêncio.

saber onde está quem se conectava a esta mão que faz o gesto familiar na direção do meu rosto e tira um cisco um fio fora do lugar, como tantos, tantos fios. perco o poema perdemos a hora perdemos um fio de uma memória que não se perde. a palavra se enrosca e se esconde na raiz de outra palavra que procuro procuro.

preparo um chá para este dia outra vez frio primavera e abril.
corto o pão em fatias.
busco o mel.
pergunto a cada poeta o que me diz em suas primeiras páginas sobre o deserto e onde está a nota de rodapé que agora me soa única explicação do mundo. as explicações – sempre elas – busco a sequência da vida. às vezes a poesia está na explicação. como as nascentes secam e brotam entre as pedras e os cactus. o mistério é a palavra que cria águas não a nascente.
as nuvens carregadas se sabem o revés da poesia, deste verso que busco no gesto da tua mão.
entre os livros ouço o grito de um cego e meus olhos de vidro se voltam para o céu.

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