29 de dezembro de 2017

abacate



(gary snyder)

O Dharma é como um abacate!
Algumas partes tão incrivelmente maduras,
Mas são boas.
E outras, duras e verdes
Sem muito sabor, 
Como para os que gostam dos ovos muito cozidos.

E a pele é fina,
O enorme caroço redondo 
No centro,
É tua própria Natureza Original --
Pura e suave,
Quase ninguém o quebra em dois
Ou tenta ver
Se crescerá.

Duro e resvaladiço,
Parece como
Se tivesses que plantá-lo - mas então
Sai disparado entre os
                     dedos --
Se escapa.

 

25 de dezembro de 2017

poema de natal

(vinícius de moraes)




Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte -
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.

14 de dezembro de 2017

em velhecer

uma vez que a todos nos espera a morte, mais cedo ou mais tarde, envelhecer é uma dádiva, não é uma maldição. mas então por que ao chegar aos cinquenta é mais comum ouvir puxa, mas você não parece ter tanto (embora saibamos todos que nem sempre isso se diz com sinceridade, mas por convenção social) do que ouvir que bom que deve ser chegar aí. é bom chegar aqui. nem todos chegamos. nem todos chegarão. e é um sorteio, nao é um merecimento. e ao mesmo tempo é nada. comparado aos duzentos mil anos do ser humano sobre a face da terra ou os quatro bilhões de anos da própria terra, viver cinquenta ou setenta ou noventa é irrisoriamente indiferente. e no entanto.

1 de dezembro de 2017

quanto

quanto é preciso que envelheça uma galáxia para que contenha um pouco de vida? olhe o céu. e nós aqui, quanto envelhecemos até que enfim estejamos submersos em um pouco de vida? ventos de areia, como rios passando sobre a pele. serpentes cósmicas. há alguma coisa que não estamos vendo. por não conhecer.