3 de junho de 2025

abre os olhos

quando envelheceu, minha mãe, deixou de ir à praia caminhar, mas a cada dois ou três dias, ia ao encontro dos pescadores quando voltavam com seus barcos e redes, carregados de peixes.
ela nao gostava muito do cheiro do peixe fresco, nem se deixava impressionar pelos reflexos prateados à luz da manhã. o que ela gostava, mesmo, era das conversas: saber notícias da pescaria, da vila, dos filhos e netos dos pescadores que ela, à sua maneira, tinha ajudado a crescer.
na última vez que estive com ela, me acordou muito cedo dizendo estou indo. eu, morrendo de sono, tive vontade de dizer que não, que não ia ou talvez no dia seguinte. mas nao disse nada, me levantei, lavei a cara, me vesti.
vimos os barcos chegarem, vimos trazerem os peixes e os camarões, e minha mãe, enquanto escolhia, foi puxando conversa com um, com outro, até que o pescador com quem ela conversava de repente interrompeu o que dizia e apontou para o limite difuso entre os azuis do céu e do mar.
baixou um silêncio sobre todos nós, um silêncio mínimo, denso, e na linha do horizonte vimos o jorro de dezenas, dezenas de baleias que seguiam a caminho de abrolhos.

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