27 de maio de 2014
23 de maio de 2014
no trajeto do silêncio
para soraya
vi uma pessoa
no metrô que me lembrava você.
entrou
outra, que me lembrou meu pai.
a cada
parada, o vagão se enchia de rostos, todos com aspecto familiar.
pessoas são
trajetos? pessoas que se parecem são diferentes maneiras do mesmo caminho?
por um
tempo fiz um mesmo trajeto de ida e vinda. todo dia todo dia todo.
até deixar
de fazê-lo.
deixar de
fazê-lo a ponto de me esquecer de sua existência.
um dia,
muitos anos depois, eis o trajeto. e
alguma coisa em mim se lembra.
vou fazendo
as curvas, tomando as decisões de direção quase sem pensar.
a memória que vem à
tona pensa por mim.
neste não
pensar, um rio de palavras silenciosas se permite.
nenhuma
palavra diz nada.
sobre elas
chove.
sobre elas
não se desenrola o desentendimento do início dos tempos ou o verbo.
os longos trens
de carga nas estações urbanas têm um silêncio próprio, uma espécie de
solenidade, algum mistério nas pedras que carregam. em seus líquidos.
têm um
silêncio que atravessa a nossa espera.
a espera
dos trajetos que se não lembramos nos lembram.
o trajeto da marcha
das mães dos desaparecidos.
que choram.
Tradução de Joan Navarro para o catalão e o castelhano na serieAlfa, aqui.
que choram.
Tradução de Joan Navarro para o catalão e o castelhano na serieAlfa, aqui.
22 de maio de 2014
16 de maio de 2014
obsolescência programada
maio, lua
cheia de maio, uma lua de silêncios me lembra alguém, a mesma das revelações, pequenas, grandes,
que se ocultam ao se manifestar explica a mulher enquanto com a língua revira a
dentadura meio presa meio solta que o homem,
aquele homem, esse homem, das
tripas, cuidava sim do espaço passagem, varria toda manhã, nada a ficar pelo
avesso e dobrava cobertas e guardava sacos plásticos caixas de papelão, ordenava
– o entorno – não mijava – em qualquer canto, não – não defecava – à
vista – a cada manhã, olhe para o céu agora neste maio de lua cheia em algum
lugar as nuvens esgarçam as tripas deste homem – qualquer – em seu apocalipse único
e miúdo, apocalipse de cada um, que nos faz ter um novo nome, este, que não seremos, este,
que mãe nenhuma pronunciará, esta, denominação última nossa num universo que nada circunscreve – as
tripas – num fim mínimo íntimo, enquanto diziam que seriam as tais vestes
reluzentes, não eu – eu, nua, da nudez áspera dos pesadelos de não saber amar o
próximo próximo, de não saber amar – naquela boca meu nome nem, nas mãos as palmas
abertas – nelas – a chama flamejante sem bênçãos – velas – este vazio este oco
sempre estas tripas onde sou o profundo medo onde reverbera a voz e o que quer que
anuncie o que quer que diga, eu, ouvidos moucos, eu, a desdizer nada, este
nada das mãos queimadas ao tocarem o que sabe não saber o amor ao próximo distante,
o que sabe não se saber capaz – eu – sem ramo nas mãos, sem cinzas sobre a
testa – eu -- este um que se arrasta rasteja escapa enquanto os eleitos
nominados e satisfeitos, enquanto os eleitos mãos em prece, enquanto os eleitos
sem suspeitarem do meu olhar quando, do meu
olhar onde, do meu olhar enquanto – eu – à procura de quem, sabendo que não
sou digna, sabendo que nem indigna, sabendo me absurda muda obtusa contemplação
daquele de quem se diz pedra dor castigo, daquele que se diz verbo. fogo,
principio e desolação.
7 de maio de 2014
6 de maio de 2014
precipícios
no princípio, a palavra
pedra submersa na água
opaca do mundo
que não era:
só
depois
de haver pedra
depois de haver água
e palavra
um princípío
pedra submersa na água
opaca do mundo
que não era:
só
depois
de haver pedra
depois de haver água
e palavra
um princípío
Assinar:
Postagens (Atom)