22 de setembro de 2020

treze

 

 

acordou assustada como se o mar por fim lançasse na margem seu corpo estrangeiro e magro. viu nuvens confusas no céu de agosto e aviões. os roncos de motor atravessando a noite. tudo pode sempre ser só um princípio.

na cozinha escura foi o avô quem lhe ofereceu um copo e ela notou a árvore que eram os braços estendidos que sustinham a água. roçou galhos na casca áspera dos dedos.

depois, sentada naquele colo de raízes, esperou. a brisa derrubou folhas e algum fruto em desamparo. passaram em revoada fragmentos de dias vividos e outros tantos, passaram também estradas, pátrias, constelações. pequenas alegrias  pousaram em seus cabelos, feito ninhos.

ao tocar o chão, tudo tudo tudo se dissolvia e subia pelos troncos, espraiando-se.

também eu – seiva – subo subo subo e no alto posso ver a vida que se descortina tênue linha entre o amarelo e o rosa onde um mínimo sol desponta.

no colchão de crinas, dorme a memória dos cavalos.

 

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