não sei organizar as coisas. tirei uma casa de dentro de um apartamento e agora tenho uma casa que carrego comigo e um apartamento do qual mal me lembro. uns vislumbres. do sol na cozinha, sombras da cortina de crochê, o verde ventando na janela da sala. a cor entardecida das paredes, os móveis grandes, pesados, feios – um espaço em branco – e já não me lembro como era barulhento viver ali, nem lembro do assoalho que rangia, do chão do banheiro imitando madeira. tudo ali éramos nós e nada era nosso ali. nunca deixar de ser nômade.
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dia desses, desmontando a árvore de natal encontrei a bola de lantejoulas que a soraya fez em sua sapiência à espera da morte, buscando, ao mesmo, adiá-la. um alfinete espetando uma miçanga, espetando uma lantejoula minúscula, espetando uma lantejoula um pouco maior e mais outro alfinete e mais outra miçanga e mais outras lantejoulas e mais outras e mais de duzentos alfinetes com miçangas e lantejoulas espetadas numa bola de isopor, até chegar num brilho de escamas. lampejo das mãos dela, que um dia estiveram dadas às minhas, que ainda não têm a paciência de adiar a morte porque não sei nem suspeito quando é que ela vem.
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mesmo nas árvores peladas há pássaros.
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as ervilhas produzem aos poucos, sobrevivendo aos vendavais.
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colhi quatro fisalis. quase amarelos.
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plantei salsinha, que gosta de brotar no frio. e plantei tomates nuns tubos, deixei dentro, no quentinho da casa.
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