11 de março de 2015

nem digo



nem digo plantar colher
digo comprar comida crua e transformar em alimento, pão

nem digo fiar e tecer ou cortar e costurar
digo fazer barras, firmar botões, consertos pequenos. fechar vãos

não, nem fazer filhos digo
cuidá-los

nem ser o tempo que envelhece
mas guardar estes últimos momentos

não digo nunca remover pedras se é poeira que se deposita todo dia
se a roupa suja se a louça se alguém tem que fazer as compras ver se as calças se os cabelos as orelhas se os modos

todo este trabalho digo invisível, e não digo mas lembro não pago, experimente
o mundo, como é, depende dele

não viver no abandono de serpentes
não ser ninho de vespas
não ter que comer insetos
e quanto aos desertos não passar a vida atravessando areia quente e seca

digo: experimente a água, está fresca

na toalha xadrez ela deposita um copo vidro e transparente
a água do copo lentamente distorce a visão que tenho de suas mãos – ásperas
depois oferece um café
arruma um vasinho de violetas africanas, a penugem das folhas. tira as flores murchas. amassa entre os dedos

a tarde no silêncio da tarde
já termina o sol:
suspira:

...

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