quando o
verão vai chegando ao fim, é como se os verdes fossem ficando cansados. verdes cansados: alguns tendem pro amarelo, outros pro marrom. pouco a pouco as
próprias folhas se cansam. e caem. daí já é outono.
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hoje, quando fui tomar o chá no terraço, vi de novo um passarinho de peito amarelo bem pequeno. como desta vez ele não se assustou, entendi que vem nas moitas de manjericão, não sei se pra comer as sementinhas ou os bichinhos que vivem aí e eu nem vejo, de tão pequenos.
os limões da florada de setembro do ano passado continuam crescendo, lentamente. há novas flores, mas não acredito que o limoeiro dê conta de novos frutos antes que os já existentes estejam acabados. o limoeiro que eu acompanhava anos atrás era tão vasto e sempre cheio de limões que eu só reparava nele quando estava bojudo de limões maduros, e nós os colhíamos para guardar o suco congelado em formas de gelo. ou quando a floração era tanta que dava até enjoo. um dos perfumes mais maravilhosos. nem me incomodava colher algumas flores pra guardar no vinagre. era outro tipo de limão, também. este pé aqui é pequeno, num vaso pequeno. por mais que eu o alimente, as raízes devem sofrer um pouco emboladas, sem poder se distender como quem espreguiça. desde que plantei os morangos no mesmo vaso, penso que ele está mais feliz. não sei se é porque as folhas do morango sombreiam a terra e mantém a umidade, ou pela companhia, mesmo. é tão bonito ver os morangos vermelhos entre a folhagem.
como venta muito ali no alto, o melhor seria não insistir com plantas tropicais e buscar plantas mediterrâneas que gostem de vento e não precisem de muita água. as mudas de aloe vera, por exemplo, estão muito bem. um dos alecrins morreu e acho que foi por excesso de água e falta de vento. mas o outro segue bonito. talvez trazer outros alecrins para virem morar aqui. e um loureiro. e uma figueira. uma oliveira. mesmo que cresçam pouco porque vão ficar em vasos, provavelmente serão mais felizes do que seria um pé de maracujá.
no ano que vem, na primavera, vou buscar mudas. agora, que o verão vai acabando, é melhor fazer manutenção, poda, e não inventar muita moda de planta nova. é um momento difícil esse de preparação para o inverno. algumas plantas ainda estão produzindo, mas não vai dar tempo do fruto amadurecer antes que chegue o inverno. e com pouco sol, nada amadurece.
vou deixar um ano sem plantar tomates. este ano tiveram alguma praga, alguma doença que deixa as folhas secas de um dia para o outro. e uns bichinhos formam umas bolinhas pretas, uns furos, nos tomates. por dentro, continuam bons, não parecem bichados, mas estragam mais depressa. se deixar o tomate furado no pé, o bichinho come tudo por dentro. imagino que um ano sem tomates e estes bichos procurem outro lugar para morar que não o nosso terraço.
a parede onde está a treliça também vai precisar de algum tratamento de choque. tudo o que encosta ali fica amarelo e com umas teinhas de aranha, vejo cocozinhos, como os de lagartas mínimas, mas não vejo os bichos. é engraçado pensar num bicho que faça um cocô que é maior do que ele.
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sei de uma pessoa que é assim. um cara pequeno, mesquinho, mas que fez uma merda imensa no mundo. nem preciso dizer o nome. aliás, melhor não dizer o nome. só atrai coisa ruim e mais merda.
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quando vejo as plantas penso muito nas parábolas cristãs. minha compreensão do cristianismo na infância se deu pelas parábolas. algumas eu gostava muito, como a da semente nas pedras, entre os espinhos ou na terra boa. a da figueira, me assustava um pouco. também o do enterrar o talento. duas parábolas eu demorei meia vida para entender. uma é aquela que os trabalhadores são convocados em momentos diferentes para trabalhar num lugar. e no fim do dia os que trabalharam só uma hora ganham o mesmo que os que trabalharam e se cansaram o dia inteiro. demorei para entender o mistério do amor. como também o sobre o amor a parábola do filho pródigo. eu achava que era sobre arrependimento ou sobre a inveja – porque o filho mais novo fica super abalado com a festa que se faz para o filho que volta. mas tenho pensado que se trata de outra coisa. é sobre o amor. é sobre a saudade. e é sobre as diferentes formas de manifestar o amor. apesar dos horrores que se cometeu e se comete em nome de cristo, acho que o amor em todas as suas manifestações foi uma grande contribuição pro mundo. eu, com minhas limitações, meu ego tão grande e barulhento, só consegui entender algumas coisas com a maternidade e este amor que dizem incondicional. não sei se é incondicional, mas é imenso, sim.
ainda me faltam frutos, pra não secar como uma figueira.
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o sono amarfanhado entre lençois
lá fora a neblina, esse dia opaco
a catarata obstruindo a vista
o papel à sua frente
as mãos
alguém se prepara para viajar sem malas
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