25 de abril de 2020

brilhar, brilhar...


há vinte anos ela nasceu. entrei no quarto da maternidade e a mãe dela me disse: quer pegar no colo? já entregando um pacotinho mínimo. estrela. no começo achei o nome estranho, mas cada vez mais vejo que é único nome que ela poderia ter. uma presença luminosa, ali, no horizonte. nestes vinte anos que se passaram, e acho que vai ser assim para sempre, sempre reparo nas letras de canções que tenham estrela. faço uma coleção mental. pensei um dia fazer uma gravação com todas elas mas tudo isso já está tão ultrapassado que é melhor manter a lista na cabeça. e de tempos em tempos cantarolar, como uma forma de oração pela vida dela, pelos horizontes que ela vai sempre iluminar.

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no ano que fiz vinte, nasceu o meu primeiro sobrinho.
e betty blue passava no cinema.


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amanheceu ensolarado. um dia azul.
as rosas vermelhas de papel que fiz para o dia de sant jordi, e que pendem da estante da sala, hoje me lembram os cravos vermelhos da revolução de 1974, em portugal. 

25 DE ABRIL  (Sophia de Mello Breyner Andresen)
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo


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e o vírus que não sabe nada de nada além da bolha mínima de gordura no qual sobrevive em busca de células onde possa morar, segue matando. um vírus que quer viver, como eu e você, mas chega a matar quando encontra casa. e morre junto, sobrevivendo no vírus viajante.
as pessoas que morrem sobrevivem no pensamento da humanidade. cada um, único no tempo e no espaço. quanto mais pobres, mais viram estatísticas e curvas nos gráficos dos epidemiologistas e dos economistas. as pessoas que amavam quem morre não pensam se a curva faz assim ou assado, não querem saber se o petróleo isso ou aquilo, passam a conviver com um vazio, com alguém que já não é. que não está. um silêncio pesado.
no começo da pandemia, acreditava na aleatoriedade do vírus. já está mais do que explícito que não é bem assim. o aleatório é como um ponto de partida. o que se faz com este ponto de partida é que é a vida sendo.
assim como nos campos de concentração havia uma lista que definia quem entrava na câmara de gás e quem iria para outros lugares e por trás da lista havia pessoas pensando e estabelecendo critérios de vida ou morte, também nós estamos. o mundo se revela em toda a sua desigualdade. se alguém antes dissesse: não sei, não deu pra ver direito, agora já não pode dizer nada.

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enquanto isso seguem as listas nas redes sociais. de tudo o que se possa imaginar.
e segue o caos no desgoverno do brasil. como explicar o que é que está acontecendo? e pra que explicação? o humano, este cansaço.

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