23 de abril de 2020

salve, jorge!


dia de são jorge é, em barcelona, uma das festas mais bonitas.
me lembro da surpresa de ver venderem livros em supermercado, livros em todo lugar, em bancas pela cidade, muitas bancas, muitos livros, e rosas. e gente por todo lado, ocupando o espaço público, amontoando-se para pedir autógrafo de escritores de best-seller, movimento por toda a cidade. livros de presente pra uns e outros, rosas vermelhas. e nesta época a primavera já está mais do que instalada. dias longos.
este ano, a cidade deserta, cada um em casa.
agora que sei a intensidade da festa, é triste ver a cidade assim.
todo dia é triste, mas hoje especialmente.
claro que à quantidade de livros em circulação dizem que não corresponde a mesma quantidade de livros lidos, que há muito livro ruim promovido e também tráfico de rosas. este ano isso importa pouco. porque o bom das festas que se repetem a cada ano é que vão se preenchendo da memória das festas passadas, formando camadas de memórias pra aquele dia. eu, mesma, com poucos dias de são jorge vividos, já tenho um repertório de memórias significativo. umas melhores que outras, algumas ainda na alegria da descoberta, outras já na decepção do que de verdade algumas coisas querem dizer. por exemplo, a quantidade de rosas que sobram no final do dia e vão para os aterros. ninguém divulga as imagens de livros que também devem ser enviados pra incineradores porque guardar em estoque é caro. e este ano ninguém vai mostrar a tristeza das livrarias pequenas, de bairro, que conhecem o que seus clientes gostam de ler. porque está cada um em sua casa, fechado, enquanto o comércio eletrônico faz a festa. que festa, né? não vejo graça.

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fiz umas rosas de papel colorido para colocar no balcão. pequenas e desengonçadas. mas sempre podem ser um sinal para alguém, algum tipo de farol. como era um sinal carregar livros no primeiro dia de aula, pra ler se não tivesse com quem conversar, ou só atrair quem também gostasse de ler.  a memória traz umas coisas estranhas.

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mais triste do que as cidades desertas, é pensar nas estradas cheias da índia, onde as pessoas caminham para chegar em algum lugar seguro. elas continuam caminhando. continuam buscando.
nas imagens que vêm do brasil, as máquinas abrindo valas, covas rasas, têm a cara desta morte sozinha, sem a mão de ninguém, sem ar. uma morte coletiva. repare,  todos estamos morrendo um pouco na morte dos que morrem agora.

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e seguimos .

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"andarei vestida e armada com as armas de jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer mal. armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrem sem o meu corpo tocar, cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar."

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