18 de abril de 2020

sólo te pido que mi espacio llenes con tu luz


mu, o espaço entre as coisas. isso que parece vazio.
difícil pensar o vazio. quem não sabe de que é feito o ar que respiramos pensa que é o vazio que nos circunda. quem pensa no desenho tradicional de um átomo pensa que estamos, mesmo, cercados de vazio. pensa, inclusive, que somos feitos de vazio. que somos feitos pelo espaço entre as coisas. pelo vazio das coisas.
um copo vazio cheio de ar.
em tempos tão cheios, me esvaziar.

***

não sou especialista em glenn gould. várias das suas gravações para piano e órgão me acompanham há muito tempo. é uma trilha sonora que me ajuda a ter um eixo e, havendo eixo, é como se fosse possível voltar a fazer tudo girar.
quando vi o filme composto por não sei quantos curtas para explicar quem foi glenn gould, me apaixonei pelo filme e mais ainda pelo músico. uma das coisas que me fascinou foi sua decisão de não fazer mais apresentações por considerar que nem todos os que estivessem numa sala de concertos poderiam aproveitar da mesma maneira. além disso, nem todos poderiam pagar para estar numa sala de concertos. e se dedicou a gravar discos em vez de apresentações.

***

estes dias tenho pensado nisso. nada de apresentações, nada de shows, teatros, cinemas. e uma falsa ideia de que agora todos temos um acesso igual à cultura, à arte. quando tudo parece igual para todo mundo, em geral as desigualdades continuam se aprofundando. o mundo não é assim ou assado. ele está assim ou assado. depende do que se faz ou se deixa de fazer.

***

basta meter a semente na terra e já se desenha a espera em mim. o fermento na farinha. o filho na barriga. o sonho no sono. tudo cresce no escuro e se faz nesta espera que parece parada. e no entanto.
tudo o que vive espera.
as árvores no seu quase não-movimento.
e também a pedra e o coração da pedra. esperam.
talvez nosso tempo seja muito curto para apreciar o parto da pedra, seu respirar. e ela nos parece incompreensível. como uma água grávida.
ou um campo de papoulas explodindo em vermelho. que ninguém vê.

***

para evitar angústia, faço o que fiz quando há uns anos enfrentamos uns dias duros de uti.

2 comentários:

Maria Eu disse...

Basta meter a semente na terra, sim, seja a semente o que for, seja a terra que for.

Haverá dias melhores!

Um beijo

v. paulics disse...

dias-sementes no escuro da terra.
bom "revê-la". um beijo.